A emenda “constitucional” da compra de votos e o capitalismo monopolista de estado: rentismo estatal/governamental monopolista, uma discussão necessária

O Estado arrecada, o governo distribui, os pobres pagam a conta com suas vidas e a burguesia enriquece cada vez mais, como ficou evidente durante o processo da pandemia de COVID19.

Luiz Bezerra Neto

**Vinicio Carrilho Martinez

 

Neste momento em que as eleições se aproximam, não podemos deixar de apontar que um dos atos mais significativos do meio político e menos discutidos pela mídia neste ano de 2022, foi a escandalosa aprovação por parte do congresso nacional, da emenda constitucional da compra de votos através PEC 1/2022. A emenda à constituição foi aprovada pelo senado em dois turnos em um único dia e instituiu o estado de emergência até o final do ano que termina dois meses após as eleições.

O dinheiro utilizado para a compra de votos através da PEC previu um gasto de R$ 41,25 bilhões ao longo de cinco meses, cuja distribuição se daria através da expansão do Auxílio Brasil e do vale-gás de cozinha. Além disso, se criou condições para distribuir até R$ 6.000,00 para caminhoneiros e taxistas.

O mais grave é que para se aprovar esta PEC, o governo não precisou observar o teto de gastos, considerada a regra de ouro ou os dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal[1] que exigem compensação por aumento de despesa e renúncia de receita.

Ao mandar a emenda da compra de votos para o congresso, o governo da burguesia espera conquistar votos para continuar favorecendo os latifundiários, a indústria armamentista, os pecuaristas e, sobretudo o capital rentista, que a partir das décadas de 1970-1980, começou a aparecer com a expressão Capitalismo Monopolista de Estado, que, em suma, designa o papel decisivo do Estado na formação/fixação de cartéis, monopólios, oligopólios na economia – que, por sua vez, de acordo com os economistas burgueses deveria gerir-se sob as regras da “livre concorrência”.

Como foi amplamente demonstrado por Marx e Engels, a economia capitalista não é gerida livremente, ou seja, a primeira regra estabelecida pela economia política (burguesa), a livre concorrência é desfeita em nome do próprio capital já aglutinado em torno dos respectivos grupos hegemônicos de Poder. Hoje em dia, com fortunas avaliadas em alguns trilhões de dólares, algo equivalente ao PIB do Brasil, alguns grupos controlam política e economicamente algumas nações. É óbvio que as regras (ideologias) iniciais da “Mão Invisível” do Estado, do laissez faire, laissez passer, não passam verbetes para a manutenção do poder desses oligopólios.

Também é importante lembrar que distinções básicas elementares foram desfeitas ou sofreram grandes abalos, sobretudo a partir da segunda metade do século XX. Talvez a diferença mais importante seja o desfazimento da chamada Soberania Nacional, em vigência até o desfazimento do Estado-Nação a partir do último quadriênio do século passado. Àquela altura o desmoronamento das certezas ou seguranças institucionais já dava alertas e, de lá para cá, o que se viu foram os conglomerados econômicos afirmarem-se com hegemonia de poder, algumas ou muitas vezes com concentração de capital maior do que inúmeras “nações independentes”, impostas sobre as nações mais empobrecidas.

O nicho do capitalismo monopolista de Estado ainda traria outra mudança profunda: a imposição da indistinção entre Governo e Estado. Essa condição político-econômica se tornou terrível por inúmeras razões e a mais evidente conduz à indistinção entre as políticas de Estado e os anseios do governo em questão: levando, por exemplo, à subsunção do Estado pelo governo de ocasião.

A captura do Estado – a “instituição” reguladora de todas as demais instituições – por um dado governo levaria claramente à fratura de uma regra essencial do poder: a transitoriedade no contexto do pluralismo. A inoperância pública/estatal, propositalmente criada e gerida pela burguesia salta aos olhos. Atualmente, esse quadro é bastante óbvio, na relação, por exemplo, do(s) Estado(s) em vias da obtenção de renda pública junto à especulação na(s) bolsa(s) de valor(es). No entanto, sua amostragem remonta a pelo menos 50 anos.

Desde a era em que o capitalismo monopolista era tarefa primordial do Poder Público, até a atualidade, em que o próprio Estado é totalmente subordinado – em função de reunir menos poder de mando do que os monopólios e oligopólios a quem deu origem e guarida –, os governos de plantão cada vez mais se imiscuem na forma-Estado. O Estado rentista, além de promover a captura do Estado, pelo governo – Grupos Hegemônicos de Poder – ainda alimentam a máquina pública na contramão dos interesses da classe trabalhadora, privatizando as benesses recolhidas através dos lucros (rendimentos, dividendos) das empresas públicas aos indivíduos que apoiam alguns governantes.

É muito claro esse desenho no Brasil, mormente em 2022, pois, o governo que se encontra no controle do Estado distribui o que arrecada como Estado acionista da B3 (Bolsa de Valores) na forma de auxílio emergencial na ânsia de comprar votos, junto ao eleitorado mais pobre e que, tornou-se ainda mais pobre, exatamente pelas políticas econômicas praticadas por esse governo antipopular. O Estado arrecada, o governo distribui, os pobres pagam a conta com suas vidas e a burguesia enriquece cada vez mais, como ficou evidente durante o processo da pandemia de COVID19.

Como vimos, o Estado brasileiro foi capturado por um governo de cunho fascista, com total desprezo pela democracia, pela Constituição, pelo Estado de Direito e dos institutos e recursos republicanos. A capitulação dos lucros das empresas estatais nacionais, listadas na B3 – a exemplo apenas das maiores: Banco do Brasil, Petrobrás, Caixa Econômica Federal –, ocorre unicamente para comprar votos nas eleições de 2022.

Além de ser evidente a prática de crime eleitoral, essas mesmas estatais (altamente lucrativas) agora se veem descapitalizadas para assegurar novos investimentos, especificamente porque os governantes do país se apoderam de sua administração para usurpar seus lucros visando financiar votos de cabresto.

O pior de tudo isso nós vimos acontecer com a Petrobrás. O preço dos combustíveis foi às alturas, rebatendo no custo da produção industrial, na distribuição junto ao comércio, no custo de vida dos mais pobres e humilhados pela fome, na incontrolável inflação que condenou milhões ao desemprego e à morte (por fome aguda). O povo ficou esquálido, mas a empresa empoderou-se como nunca nesse butim à dignidade humana.

A Petrobrás, com os cofres cheios, refém do “governo fascista”, repassou ao “governo eleitoreiro”, dezenas de bilhões de reais – dinheiro que vem sendo queimado em emendas parlamentares do “centrão”, o rodapé da pior política, e na PEC do auxílio emergencial, que deveria ser chamada PEC da compra de votos.

O dinheiro que deveria abastecer os cofres públicos, para o Estado investir em infraestrutura, saúde, pesquisa, educação pública, etc., foi abocanhado pelo grupo de deputados e senadores que compões o centrão, através de negociatas, realizadas pelo governo de Jair Bolsonaro, Paulo Guedes e seus asseclas.

A conclusão inicial é esdrúxula e estapafúrdia, posto que os dividendos aferidos pela empresa, no caso da Petrobras é subtraído, expropriado e será utilizado para pagar o auxílio emergencial prometido: o povo continuará pobre, desempregado, faminto, mas pagando dividendos estratosféricos, que serão usados na compra do seu voto por aqueles que governam o Estado com métodos fascistas.

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