Reformas Pombalinas de Educação

Significado: 

REFORMAS POMBALINAS DE EDUCAÇÃO [1]

 

As reformas político-econômicas administrativas, educacionais e eclesiásticas empreendidas por Sebastião José de Carvalho e Melo (1699-1782), o Marquês de Pombal,  tiveram início com a missão de reconstruir Lisboa, após o terremoto de 1755. Desta empresa, Pombal saiu fortalecido para implementar reformas em várias áreas do estado português.

O ambiente intelectual em Portugal no século XVIII permitia debates intensos sobre questões fundamentais ligadas à filosofia e à educação. Martinho de Pina e Proença (1693-1743) foi o autor dos Apontamentos para a educação de um menino nobre (1734), obra muito influenciada por Locke, Fénelon e Rollin e tentou adaptar a Portugal algumas da teorias de Locke. Proença recomendava aos professores que insistissem não só com o latim mas também com a geografia, a história, a matemática e o direito. Outro cristão-novo, Dr.Jacob de Castro Sarmento (1692-1762) introduziu em Portugal as idéias newtonianas. Antonio Nunes Ribeiro Sanches (1699-1783), também cristão-novo e conhecido de Pombal em Viena quando este era embaixador, desenvolveu planos para a reforma do ensino médico em Portugal, em 1730. Deixou Portugal em 1726 para fugir da inquisição, trabalhando daí em diante na Inglaterra, Holanda, Rússia e finalmente França, onde de 1747 até sua morte, em 1783, foi colaborador dos enciclopedistas escreveu sobre medicina, pedagogia e economia. Ribeiro Sanches escreveu também sobre a reforma educacional em suas Cartas sobre a educação da mocidade (Paris, 1759).

A maior influência nesse processo de inovação pedagógica foi o oratoriano Luís Antonio Vernei (1713-1792), autor de O verdadeiro método de estudar,  que era um manual eclético de lógica, um método de gramática, um livro sobre ortografia, um tratado de metafísica e continha dezenas de cartas sobre todos os tipos de assunto (MAXWELL, 1996, p.12), publicado pela primeira vez em Nápoles, em 1746. Vernei acreditava que a gramática deveria ser ensinada em português, e não em latim, foi um firme adepto dos métodos experimentais e se opunha a um sistema de debate baseado na autoridade, como a tradição escolástica (auctoritas).

A conseqüência mais imediata desse debate filosófico em Portugal foi levantar a questão da influência da Companhia de Jesus (1534-1773). Isto se deu porque os jesuítas mantinham um quase monopólio da educação superior e eram, do ponto de vista de seus oponentes, os principais defensores de uma tradição escolástica morta e estéril, inadequada à idade da razão. Na verdade, os jesuítas eram bem menos fechados às idéias modernas do que supunham os seus opositores. O inventário dos livros da Universidade de Évora (controlada pelos jesuítas juntamente com algumas faculdades de Universidade de Coimbra) continha trabalhos de Bento Feijó, Descartes, Locke e Wolff. O Colégio dos Jesuítas em Coimbra possuía o Verdadeiro método de Vernei .

Em Portugal, os jesuítas tinham o direito exclusivo de ensinar latim e filosofia no Colégio de Artes, a escola preparatória obrigatória para ingresso nas faculdades de teologia, leis canônicas, leis civis e medicina na Universidade de Coimbra. A única outra universidade de Portugal, a de Évora, era uma instituição jesuítica. No Brasil, os colégios jesuíticos eram as principais fontes para a educação secundária. E no que restava do império de Portugal na Ásia haviam sido a força dominante desde os primórdios da expansão portuguesa no Oriente, sendo que alguns deles chegaram a ser mortos no cumprimento da missão evangelizadora.

Alguns dos mais defensores (e também profissionais) da reforma educacional saíram da instituição religiosa, como os oratorianos. As reformas aconteceram em várias frentes. A década de 1760 marcou um período de consolidação e amplificação das reformas iniciadas durante a década anterior. Estas incluíam a estruturação de um novo sistema de educação pública para substituir o dos jesuítas expulsos em 1759. A Companhia de Jesus surgida no espírito da contra-reforma, exemplificava as reivindicações ultramontanas da supremacia papal, a disputa portuguesa com os jesuítas foi, portanto, mais do que uma questão de interesse local.

A reforma educacional tornou-se uma alta prioridade na década de 1760. A expulsão dos jesuítas deixara Portugal despojado de professores tanto no nível secundário como no universitário. Os jesuítas haviam dirigido em Portugal 34 faculdades e 17 residências (colégios). No Brasil possuíam 25 residências, 36 missões e 17 faculdades e seminários.

As reformas educacionais de Pombal visavam a três objetivos principais: trazer a educação para o controle do Estado, secularizar a educação e padronizar o currículo. Já em 1758 foi introduzido o sistema diretivo para substituir a administração secular dos jesuítas. Os diretores deveriam ocupar os lugares dos missionários e duas escolas públicas deveriam ser estabelecidas em cada aldeia indígena, uma para meninos e outra para meninas. Aos meninos se ensinaria a ler, escrever e contar, assim como a doutrina cristã, enquanto as meninas em vez de contar, aprenderiam a cuidar da casa, costurar executar outras tarefas. Os diretores, diferentemente dos missionários, deveriam impor às crianças indígenas o uso do português e proibir o uso da própria língua.

As reformas, no plano prático, enfrentaram problemas expondo a grande distância entre formulações legais e realidade. “O ensino, do nível das primeiras letras ao secundário, passou a ser ministrado sob forma de aulas avulsas, fragmentando o processo pedagógico. Faltaram professores, manuais e livros sugeridos pelos novos métodos. Os recursos orçamentários foram insuficientes para custear a educação pública, havendo atrasos nos salários dos mestres. A Coroa, em determinadas ocasiões, chegou mesmo a delegar aos pais a responsabilidade pelo pagamento dos  mestres. Isso mostra como a educação, tornada pública pela lei, esteve em grande parte privatizada”. (VILLALTA, p. 351).

A Companhia de Jesus foi uma das vítimas mais evidentes dos acontecimentos postos em marcha pelas pretensões imperiais do governo de Pombal e pelas tentativas de nacionalizar setores do sistema comercial luso-brasileiro. A biblioteca londrina de Pombal já refletia suas pretensões e interesses no campo político-econômico. Dentre os livros de autores ingleses havia relatórios selecionados sobre colônias, comércio, minas, lanifícios, cursos especializados sobre açúcar e pesca, leis parlamentares sobre a tonelada de carga transportada, frota mercante e navegação, fraudes alfandegárias, livros de tarifas, regulamentos da marinha inglesa e, principalmente, sua coleção era um verdadeiro tesouro de clássicos mercantilistas – com grande concentração em livros sobre companhias de comércio”, segundo Maxwell ( 1995, p. 42).  Esse esforço intelectual justificava-se ante as perspectivas de encontrar os meios para neutralizar a predominância inglesa sobre Portugal.

Os jesuítas dominavam as fronteiras nos dois pontos mais sensíveis e vitais do sistema imperial: o rio Amazonas ao norte e os rios Uruguai e Paraguai ao sul. Opondo-se às autoridades seculares da América do Sul, as missões guaranis pegaram em armas.

A Companhia de Jesus estava presente como fator de empecilho às reformas econômicas e educacionais de Pombal o que explica a sua expulsão e proscrição. Na última daquelas, conforme já foi mencionado, por deter o quase monopólio da educação em Portugal. As primeiras, explica-se em virtude “do interesse do Estado na libertação dos índios chocar-se com os dogmas filosóficos fundamentais da política protecionista dos jesuítas. A política dos jesuítas em relação aos indígenas também ficava a meio caminho, como um obstáculo ao desejo de povoar e de europeizar o interior, mediante a assimilação, e os indígenas – conforme acreditavam Francisco Xavier de                                                               Mendonça Furtado e Pombal – ‘devião constituir a principal força, e a principal riqueza para (...) defender [a coroa] nas mesmas fronteiras’. A isenção de que gozavam as missões do extremo norte, quanto a contribuições para o Estado, criara uma tensão entre elas e a administração secular que tentava consolidar as finanças e fortificar o Amazonas.” (MAXWELL, 1995, p.43).

 

Referências bibliográficas:

FALCON, Francisco. A Época Pombalina. São Paulo: Editora Ática, 1982.

MAXWELL, Kenneth. Trad.  João Maia. A Devassa da Devassa - A Inconfidência Mineira: Brasil e Portugal – 1750-1808. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1995.

___________________Marquês de Pombal - Paradoxo do Iluminismo. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1996.

VILLALTA, Luiz. O  que se fala e o que se lê: língua, instrução e leitura, in: MELLO E SOUZA, Laura  de (org.). História  da  vida  privada  no  Brasil: cotidiano  e  vida  privada  na  América  portuguesa. São Paulo: Companhia  das  Letras, 1997. Vol.1.

 

 

[1] Verbete elaborado por Sônia Maria Fonseca

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