Relatório da Província de Mato Grosso - Joaquim Gaudie Ley 1858

Relatório do Inspetor de Instrução Pública da Província de Mato Grosso - Joaquim Gaudie Ley ano de 1858

 

 

 

Introdução

André Paulo Castanha[1]

 

Informações sobre o Autor

O Inspetor Joaquim Gaudie Ley era comerciante e conseguiu conciliar as atividades comerciais com inúmeros outras de cunho público e social na Província de Mato Grosso. Foi deputado provincial, provedor da Santa Casa de Misericórdia, Juiz de direito e municipal, chefe de polícia, membro da Caixa Econômica e Monte Socorro, secretário da Companhia Empresário de Theatro, vice-presidente da Província e Inspetor Geral de Instrução Pública por um período de 22 anos (1849-1871). Recebeu o título de Comendador e foi condecorado pelo governo imperial com o oficialato da Ordem da Rosa. José de Mesquita conta que Gaudie Ley recusou o título de Barão oferecido pelo Imperador. Para usufruir o referido título, teria que fazer uma doação muito generosa em dinheiro a uma instituição de caridade do Rio de Janeiro. Declarou que aceitaria o título se esta doação pudesse ser feita para a Santa Casa de Misericórdia de Cuiabá. Como o Imperador não aceitou a sua proposta, ele renunciou ao baronato. Destacou-se na tarefa de organizar a instrução pública na província propondo várias medidas visando colocar a instrução a serviço do desenvolvimento moral dos professores e alunos. Várias das suas idéias acabaram virando lei no regulamento de 1873.

Os inspetores faziam a inspeção nas escolas públicas e particulares, fiscalizavam o trabalho dos professores. Geralmente no inicio de cada ano elaboravam um relatório sobre a situação da instrução publica encaminhando ao presidente da Província, o qual colhia as informações e apresentava aos deputados provinciais no inicio do trabalho legislativo.

Não há dúvidas da importância dos relatórios dos inspetores de instrução pública como fontes primárias essenciais para compreender o processo de organização da instrução pública, na Província, enquanto política do Estado. Os relatórios dos inspetores serviam de base para os presidentes elaborarem seus relatórios anuais apresentados à Assembléia Provincial. Em muitos casos, os presidentes apenas reproduziam o texto dos inspetores. Os historiadores da educação que consultaram apenas os relatórios dos presidentes deram crédito a estes por afirmações que, muitas vezes, não eram deles, mas sim dos inspetores. Por isso trabalhar com os relatórios é uma ótima opção para a compreensão da instrução pública no século XIX.

Os relatórios descrevem diversos aspectos da instrução pública, uns de maneira mais aprofundada, outros mais superficial. Destacam-se os seguintes temas: inspetores paroquias, criação de escolas, mobília, funcionamento das escolas, matrículas, freqüência, exames, alunos carentes, premiação dos melhores alunos, métodos de ensino, disciplina nas escolas, formação dos professores, concursos, salário, condições de trabalho, currículos, inspeções nas escolas, orçamento, ensino secundário, particular, escolas femininas. Enfim, são documentos completos e amplos, que oferecem muitas possibilidades de estudos.

O texto que apresento a seguir foi transcrito dos originais, ainda na forma manuscrita. Nele foram respeitados a forma de organização das idéias e os sinais de pontuação, atualizando apenas a grafia. A seguir você poderá consultar na íntegra uma fonte fundamental sobre a educação na Província de Mato Grosso.

 

 

 

Relatório do Inspetor de Instrução Pública Joaquim Gaudie Ley – elaborado em 29 de janeiro de 1859, correspondente ao ano de 1858. Arquivo Público do Estado de Mato Grosso. Lata, B - Pasta Inspetor Geral dos Estudos.

 

 

A pouco mais de nove meses expus a V. Ex. o estado da instrução pública, confiada a minha inspeção; e com quanto pouco alteração tinha-se depois dado, cumpre-me com tudo em obediência ao que V. Ex. ordenou-me em ofício de 16 de outubro próximo passado, antecipar a apresentação deste relatório, que se refere ao movimento das escolas no ano ultimamente finda.

Devo porem prevenir que esta antecipação não, pode deixar de prejudicar algum tanto a exatidão dos quadros, por que só no corrente mês podiam-me ser enviadas as informações sobre o ano todo; o que só pude conseguir das Paróquias menos remotas.

 

Inspetoria Geral e Paroquial

Parece-me por hora, e mesmo por muito tempo ainda, não será possível descobrir-se melhor meio de inspeção do que o atual estabelecido pelo Regulamento de 30 de setembro de 1854, que dando um Inspetor e um substituto deste a cada Paróquia, deu por assim dizer também uma inspeção particular a cada uma escola pública.

Devo confessar que todos os inspetores e substitutos tem servido bem, mas tornar-me-ia injusto se deixasse de mencionar os nomes dos da cidade de Mato Grosso, O Reverendo Joaquim Amora do Sacramento e das Vilas de Diamantino e Poconé e Parnayba Capitão Benedito José da Silva Franco, Capitão João Numes Bueno do Prado, e o Rer. Vigário Francisco de Sales Souza Fleury, e da Paroquia de Pedro 2º e o cidadão Ricardo Franco de Almeida Sena, cuja dedicação tem sido notável e digna de louvores.

Acham-se preenchido todos os lugares destes empregados tendo V.Exº a pouco provido as vagas que algumas mudanças tinham ocasionado.

A escrituração desta inspetoria, ponto que cresce diariamente continua pela assiduidade do seu único amanuense, a estas sempre em dia, e na melhor ordem possível.

O quadro n. º 1 é o destes empregados.

 

Professores

Durante o ano próximo passado somente o professor da Paróquia de N.S. da Guia, José Duarte Ribeiro Cote foi demitido a requerimento seu; a cadeira foi logo posta a concurso e provida em Deucleciano Fausto de Araújo, a 19 de junho.

Foram também providos os lugares de professores adjuntos a escola de 2º grau em Francisco Leite de Pinho, a 26 de abril.

De professor interino da cadeira de Miranda em Reginaldo dos Santos a 2 de março.

De professor também interino de Vila Maria em José Gomes Pedroso, a 30 de outubro.

Estiveram e continuaram vagas as das Paróquias de Albuquerque e Rosário.

Tendo os professores desta Capital o Alferes Manoel Ribeiro dos Santos Tocantins e D. Umbelina Carolina Barreto Rodrigues, requerido os seus títulos de vitalicidade, por se acharem preenchido as condições exigidas pelo art. 16 do Regulamento, assim V. Ex. houve por bem deferir-lhes.

O professor interino da vila de Poconé requereu sua jubilação com vencimento proporcionado ao tempo que tem servido. A sua avançada idade, seu estado inteiramente valetudinário, de que certifiquei-me quando em maio último fui aquele lugar, e finalmente sua numerosa família e pobreza, o tornam digno de atenção, embora da letra e do espírito do regulamento se entenda que só tem direito a jubilação os professores vitalícios. Estes tem servido mais de 17 anos, e deve de qualquer forma ser despedida à vista da sua incapacidade física. E aproveitando tão apropriada ocasião, chamo a seu favor a benigna atenção de V. Ex.

Contra o professor interino da cadeira da Paroquia de Santo Antônio, Lourenço José de Oliveira, tem-me chegado algumas queixas. Procurando verificá-las conheci que se não todas grande parte delas são fundadas, e a bem disto, a existência no mesmo distrito de duas escolas particulares, qualquer delas mais freqüentadas e conceituadas de que a pública parece confirmar as acusações que sobre ele pesam.

A propósito desta cadeira devo acrescentar, que tenho informações dignas de peso, de que o lugar da Matriz é o menos próprio para a sede da escola, e por isso pedindo a V. Ex. que esta cadeira seja posta a concurso, lembro também a conveniência da sua transferência para a povoação do Poço por ser este lugar o mais populoso e cômodo da freguesia.

Ainda não posso infelizmente, falar bem de todos estes empregados, nem ao menos da sua maioria; e a vista do nosso estado ou falta de pessoal habilitado, o magistério continuará a ser entre nós salvas poucas exceções a apanagia dos indivíduos que se reconhecem incapazes de ganhar a vida de outro modo.

Pela lei n.º 11 de 6 de julho do ano passado foram elevados os vencimentos dos professores, conforme havia eu proposto no relatório último. Posto que este aumento de um terço mais não esteja em relação ao que deveria ser, a vista dos preços de todos os gêneros indispensáveis à subsistência, todavia não desconheço que nossas atuais circunstâncias mais não permitem.

Agradeço, portanto a V. Exº e ao Corpo Legislativo da Província mais este benefício, que espero muito servirá para suavizar a sorte dos professores. O quadro n.º 2 mostra os nomes, datas das nomeações e mais circunstâncias a respeito deles.

 

Número de Escolas e sua Freqüência

Das 18 escolas públicas de primeiras letras criadas, estiveram em exercício durante o ano todo treze (13), em parte dele três (3) e vagas duas (2). Foram das freqüentadas por 760 alunos de um e outro sexo, distribuídas conforme se vê do respectivo quadro que comparado com o do ano anterior, dá a diferença de 52 para mais. Em 1854 quando se promulgou a reforma da Instrução este número era de 417. Só o exemplo de boas escolas, produzindo seus benefícios poderá, no meu pouco entender, convidar os pais negligentes do futuro dos seus filhos a levá-los à elas para receberem a tão necessária instrução primária, fonte primordial da civilização.

A instrução primária não é só uma dívida social para o povo; é também uma necessidade pública: sem ela a religião, as luzes, a ordem e a segurança pública dificilmente serão conservadas; pois é certo que em todos os tempos e lugares a ignorância tem sido a mãe de todos os crimes.

Convencido, pois desta verdade, lembraria a conveniência de dar-se, não obstante nossos fracos recursos, mais alguma proteção aos alunos pobres, pois é certo que as vezes em alunos da última pobreza brilham talentos dignos de serem aproveitados.

Do número dos meninos das escolas públicas, reunindo-se 250 das particulares, 80 da Missão de Nossa Senhora do Bom Conselho, e mais 80 das escolas dos Arsenais de Guerra e Marinha, dão um total de 1.170, que recebem a instrução primária, sem contar-se as de outras escolas particulares de que não recebi informações; o que da a razão de 1:42 habitantes computados as populações indígenas e escravos, e de 1:20 somente a livre.

Noto que na freguesia da Capital, a razão dos alunos para com sua população leva tanta vantagem às de fora, que faz supor o ensino primário nesses lugares como abandonado.

Correspondeu a despesa com cada aluno das escolas públicas à Res. 8$837.O quadro n.º 3 mostra o número destas escolas, sua freqüência, sexos, idade e classes.

 

Exames

Nesta capital tiveram lugar nas casas da câmara Municipal, nos dias 13 e 14 de Dezembro os exames anuais das escolas públicas. Foram aprovados seis alunos da do 2º grau, quatro plenamente e dois simplesmente. Da do 1º grau foram também seis alunos, todos simplesmente.

A professora da Capital apresentou pela primeira vez, como prontas, quatro de suas alunas, sendo todas aprovadas plenamente.

Na freguesia de Pedro 2º, de três alunos examinados, somente um foi aprovado, e isto mesmo simplesmente. Na do Livramento dois aprovados plenamente e um reprovado.

Na cidade de Mato Grosso, dois plenamente e dois simplesmente. Nas outras freguesias, de que tenho comunicação, não houve exames por falta de alunos prontos.

Devo em obséquio a verdade declarar a V. Ex. que os exames nesta Capital são rigorosamente feitos, e por isso bem merecido os títulos de prontos que aos aprovados se expedem em conseqüência deles.

O ensino de gramática e aritmética dado na escola de 2º grau continua a chamar para estes exames a atenção de todas as pessoas inteligentes: na verdade, que espetáculo mais tocante haverá do que ver-se um menino de 9 a 10 anos, e as vezes de menos resolver com grande desembaraço, problemas de aritmética, escrever com perfeita ortografia um trecho de qualquer livro que pela primeira vez lhe é ditado, dividir suas orações e analisá-las minuciosamente, descendo até os mais pequeninos detalhes da gramática com exemplificação de toda a análise.

Que esperanças não despertam eles nos corações de seus pais? Quão nobre não é o desvanecimento do mestre que nos oferece estes espetáculos que algum tempo antes pareciam impossíveis.

Entendo Exmo. Senhor Presidente, que este professor tem bem merecido da Província.

Foram distribuídos com todas as solenidades do Regimento, prêmios de livros apropriados a todos os alunos aprovados plenamente, assim mais os de bom comportamento. O quadro n.º 4 mostra os nomes dos aprovados.

 

Casas Mobílias e utensílios

Os professores das cadeiras da capital tem, a título de aluguéis de casas, a gratificação de 192$ reis e as professoras, a de 100$reis por ano.

Todos os mais só a tem quando pelos respectivos mapas mostram que sua escolas  são freqüentadas por número superior a 40 alunos.

Saltam aos olhos não só os abusos que podem dar-se na percepção destas gratificações, como também a sua desigualdade pela espantosa diferença nos preços dos aluguéis. Mas cumpre assim seguir-se até que a experiência aconselhe a reforma da lei que isto estabeleceu. Nada mais tenho a acrescentar sobre este ponto, além do que disse no último relatório.

A Assembléia ainda deixou de consignar fundos para este fim mui diminuta quantia, entretanto, não pode deixar de reconhecer a necessidade de suprirem-se algumas escolas, de cujos professores recebo constantemente reclamações a respeito.

Espero que V.Exa. providenciará de sorte que esta necessidade seja atendida.

O número dos alunos pobres, conforme o dito quadro n.º 3, sobe a 338, para cujo suprimento de papel, tinta, penas etc. foi votado a quantia de 400$000, que mediante a extrema paranóia que na sua distribuição tem havido, conto que seja suficiente.

 

Ensino da Escrituração Mercantil

Enquanto não se promulga o Regulamento desta cadeira, acho conveniente que ela seja Provida interinamente, não só em satisfação a Lei que a criou, como também porque pela prática adquirir-se-ão, por certo, bases seguras sobre o melhor meio de seu ensino.

 

Escolas Particulares

O quadro n.º 4 mostra o número das escolas particulares, os seus lugares, professores e números dos seus alunos, sexos, etc.

A lei e o Regulamento da instrução pública não sujeitaram estas escolas à dependência de qualquer licença para a sua abertura ou estabelecimento; pode-se dizer que a este respeito existe a maior liberdade possível, provindo direto a falta de conhecimento de muitos. Concebe-se facilmente quão prudente seria estatuir-se que elas dependessem de licença, e mesmo da exibição, se não de completas habilitações, ao menos de provas de moralidade da parte dos seus mestres. Vê-se q eu as que compreende o quadro foram freqüentadas por 250 discípulos, sendo 34 do sexo feminino. Quanto as habilitações de seus professores, nada de satisfatório poderia dizer se não em referência a dois ou três.

 

Instrução Secundária

Pela primeira vez tenho de tratar sobre as aulas maiores da Província, visto ter V. Exº em Ofício de 27 de outubro último declarado que do artigo 3º da lei n.º 2 de 22 de dezembro de 1836 que nesta província criou o lugar de Inspetor Geral Estudos, não se deviam entender suas atribuições circunscritas somente as aulas primárias.

Na verdade parecia um absurdo que tais aulas estivessem como estão fora das vistas do Inspetor Geral, e sujeitas as câmaras municipais e seus fiscais, de quem os professores recebiam os atestados de assiduidade, etc.

Demais, tendo em 1854 sido dado Regulamento para a instrução pública, somente a primária foi nele compreendida, e por isso entende, creio que com muito boa razão, que minhas atribuições como Inspetor Geral, definidas pela primeira vez no dito Regulamento, não deviam ir além das primárias. É verdade que o Exmo. Antecessor de V. Exº declarou-me em fins daquele ano a sua intenção de dar um Regulamento para a instrução secundária, e de certo nós o teríamos desde muito tempo, se as ocorrências políticas que o chamaram e o detiveram por espaço de dois anos na fronteira do Baixo Paraguai não desviassem a sua sábia atenção para negócios de mais alta monta para o Império. Desde porém que recebi o dito ofício de V. Ex., passei a fazer do Regulamento de 30 de setembro de 1854 (o da instrução primária) toda a aplicação possível às aulas maiores, sujeitando as dúvidas às decisões de V.Exa.

A lei n.º 2 de 5 de julho de 1848 criou nesta capital um Liceu com quatro cadeiras, sendo uma de gramática latina, tradução e leitura da língua francesa; outra de aritmética, álgebra e escrituração mercantil; e outra de geografia e história e outra finalmente de filosofia racional e moral, precedida de noções de física e história natural. Aos seus lentes e professores marcou-se um ordenado de 600$000 anuais e mais a gratificação de 400$000 ao que fizesse as vezes de diretor. É notável que se igualassem os ordenados dos professores de tão diferentes matérias, e que ao porteiro encarregado do aceio da casa vencendo 200$000 por ano, se encarregasse ao mesmo tempo da escrituração do Liceu.

Ignoro as causas por que as administrações daquela época em diante deixaram do menos de tentar a execução desta lei; parece-me porem certo que quem tal empreendesse, ver-se-ia em grandes dificuldades, e os resultados não corresponderiam aos sacrifícios.

Agora porem, que o seminário da conceição vai ser aberto nesta cidade com suficiente número de cadeiras para os jovens pretendam ou busquem uma educação mais apurada, parece-me que desnecessário tornou-se o Liceu, cujas portas só se abriram mediante a quantia de 40$000 à título de matrícula.

Existem em toda a província três cadeiras da instrução secundária, sendo, na capital, uma de filosofia racional e moral, de que é lente o Reverendo Padre Ernesto Camilo Barreto, freqüentado por 12 alunos;; outra de gramática latina e francesa, de que é professor o Reverendo Manoel Pereira Mendes, freqüentada por 44 alunos, dos quais 19 aprendem simultaneamente o Francês, e mais outro na Vila de Poconé, de que é professor Luz da Costa Ribeiro, freqüentada por 3 alunos apenas! Como estabelecimento, porém do Seminário, estas aulas, de menor as da capital, devem ser fechadas, já porque seus professores foram nomeados para as cadeiras do mesmo estabelecimento, já também por que a substituição deles, além de difícil pela falta de pessoal, seria um luxo de despesas não confortável pelas nossas circunstâncias. Além destas, existem a aula particular e gratuita de Latim do Reverendo Padre Mestre Joaquim Antônio da Silva Rondon, freqüentada por 15 alunos, com as quais eles tem de passar para o Seminário, em conseqüência de achar-se nomeado para ali ensinar a mesma língua. Vê-se, pois que a instrução secundária é dada nas três cadeiras públicas a 59 alunos e na particular a 15, somando tudo o n º é de 74 na verdade bem diminuto para uma província.

A lei n º 4 de 22 de abril de 1837 estabeleceu que os professores das aulas maiores que dentro de seis meses não tivessem pelo menos seis alunos daquela data em diante percebiam metade do ordenado; e se passando este tempo continuassem a não ter aquele número seriam, demitido sem direito a vencimento algum, e postas as cadeiras novamente a concurso.

Se por um lado parece injusto esta lei punindo os professores por um fato que pode ser alheio à sua vontade, por outro acho-a convenintissima, por quanto a pouca ou nenhuma freqüência de uma escola, quando não provêm de defeitos do mestre, porém de certo da nenhuma vocação dos habitantes para a mesma matéria ensinada, e em qualquer destes casos a continuação de semelhantes dispêndios seria uma superfluidade em proveito somente dos mestres.

A extinção destas cadeiras sugerem a idéia da criação, nesta capital, de duas outras, sendo uma de música e outra de desenho, por que seriam certamente freqüentadas com muito proveito.

A Música como V.Ex. º bem sabe, é hoje considerada uma importante parte da educação de ambos os sexos, pois ninguém lhe pode negar o poder de suavizar e polir os costumes, tornar sensíveis os corações, animar a imaginação e exaltar os brios nacionais.

Quase outro tanto pede-se dizer do desenho, que além de muito útil e necessário, dá, assim como a música, aqueles que conhecem, incontestável superioridade, educando-lhes o gosto, e inspirando-lhes verdadeiro sentimento do belo.

 

Orçamento

A despesa com instrução pública no ano passado foi orçada em 11:840$000, e a efetiva, computadas as quantias por se pagarem, não passou de 8:816$493, inclusive 2:100$000 com a instrução secundária, havendo, portanto a diferença para menos de 3:023$507, proveniente das despesas que se deduziram de fazer com as escolas vagas, e das quantias destinadas para gratificação dos professores que ensinassem meninas nos lugares em que não há escolas para elas. A que deve-se fazer no presente ano, foi orçado em 12:796$000.

A que se deve fazer no seguinte ano, conforme o orçamento que apresento, é de 12:856$000.

Da quantia de 10:000$000 com que o governo Imperial houve por bem por uma judiciosa liberdade, subsidiar a instrução pública nesta Província, nada se tem gasto, em conseqüência de ter sido determinada para compra de casas para as escolas. Parece-me ser este destino o melhor que se poderia a essa quantia, por quanto deste modo conserva-se sempre a sua importância, fixam-se algumas escolas em lugares apropriados e com modos, e evitar-se a Presidência a dispêndio que faz com aluguéis.

 

Conclusão

Tenho Exmo. Senhor Presidente, cumprido tanto quanto me é possível a obrigação que o Regulamento me empoem, de informar à V. Exº  sobre o estado da instrução pública e particular da província e merecidamente confiada aos meus fracos recursos e aqui terminando, rogo a V.Exº , não por minha formalidade, mas por sincera convicção das informações deste trabalho, haja com a sua reconhecida e costumada indulgência, de desculpar-me-as, do menos pela intenção que sempre acompanhou-se de bem cumprir os meus deveres.

Deus guarde a V. Exº por muitos anos. Inspetoria Geral dos Estudos, em Cuiabá, 29 de janeiro de 1859.

Ilmo e Exmo. Senr. Chefe da Divisão Joaquim Raimundo de Lamaré, Digníssimo Presidente desta Província.

 

 

[1] Professor no Colegiado de Pedagogia da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Unioeste, campus de Cascavel. Membro do Grupo de Pesquisa HISTEDOPR (GT local do HISTEDBR), onde desenvolve pesquisa na linha: História, Sociedade e Educação. Historiador e Mestre em Educação pela UFMT. Atualmente é doutorando em Educação pela UFSCAR na área de Fundamentos da Educação, onde desenvolve pesquisa sobre a instrução elementar no Brasil do século XIX.

Período Histórico: