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Cultura, educação, memória e saberes

José Alves Dias, Lívia Diana Rocha Magalhães
O conhecimento humano e suas expressões, por meio de um conjunto variado de linguagens, crenças, hábitos e condições materiais de existência, são bastante relevantes para demonstrar os desafios de cada sociedade em suas diferentes temporalidades históricas. Conduzidos pela educação e a memória, os saberes tradicionais são transferidos entre as gerações formando um ciclo constante de ressignificações que possibilitam distintas análises e resultados muito proveitosos. Impulsionados pelo desejo de ampliar as fronteiras do conhecimento interdisciplinar o Programa de Pós-Graduação em Memória: Linguagem e Sociedade (PPGMLS) e o Instituto Federal do Maranhão (IFMA) firmaram convênio para a criação do mestrado interinstitucional (MINTER) que alcançou o objetivo de concluir várias dissertações que espelham a diversidade regional e cultural do país. De tais esforços derivaram produções acadêmicas, associadas à contribuição de vários (as) especialistas de outras universidades e institutos de educação nacionais, que confirmam a dimensão da produção científica no Brasil e reafirmam a importância dos investimentos nas instituições públicas. A memória, examinada na perspectiva de sujeitos inseridos no âmbito formal da educação escolar ou como prática pedagógica voluntária e alternativa, a partir das mais diferentes interpretações, constata que estamos diante de temas complexos sobre os quais se lançam luzes cotidianamente. Mesmo sem a pretensão de esgotar todas as questões que emergem das lembranças das comunidades tradicionais ou daquelas mais distanciadas geograficamente, os autores e as autoras consolidaram um excelente material de leitura para a compreensão interseccionada dos aspectos culturais e educacionais dos saberes e práticas das populações investigadas. O debate se inicia com Gilberto César Lopes Rodrigues e José Claudinei Lombardi sobre a Educação escolar indígena e afirmação étnica dos Borari e Arapium da T.I. Maró, no Baixo Amazonas e o questionamento sobre o papel da educação escolar estatal para os indígenas. Para os autores mencionados a existência da luta de classes e a superação do estado capitalista associadas ao respeito e a preservação das diferentes etnias e formações sociais são requisitos preliminares para a emancipação da humanidade. Trata-se de viabilizar práticas pedagógicas que tenham como base a concretude material e transformem o atual modelo de exploração de todos os oprimidos. As reflexões sobre escolarização e povos indígenas, tendo como referência as experiências do Maranhão, principiam com Elizabeth Maria Beserra Coelho. As visões antropológicas e sociológicas fazem emergir a percepção de que naquela região, com em todo o país, a pedagogia escolar tem alcançado as aldeias. Duas situações diferenciadas são descritas no texto e demonstram que as atuais políticas indigenistas de educação, não obstante o discurso da preservação das diversidades culturais, impõem estratégias de homogeneização do Estado brasileiro. Aliás, o índio sob o olhar do outro: a diferença consentida em Nove Noites, de Bernardo Carvalho é uma excelente apreciação daquilo que difere uma pessoa de outras, avessas a si, e que ocorre quando alguém se coloca diante de sujeitos divergentes no comportamento e na cultura. Entremeando ficção e realidade na literatura, Márcia Manir Miguel Feitosa e Silvana Maria Pantoja dos Santos perscrutam a trama sobre o antropólogo americano Buell Quain que chegou ao Brasil em 1938 e desenvolveu pesquisas nas comunidades indígenas brasileiras Trumai, do alto Xingu. Isabela Cristina Torres e Silva, sob a orientação parcial de José Alves Dias, recorreu às memórias indígenas para averiguar a presença do cristianismo protestante entre os Guajajara da Aldeia Bacurizinho, em Grajaú, no Maranhão. As incursões evangelizadoras protestantes tiveram êxito e as igrejas evangélicas se fixaram permanentemente entre primeiros habitantes da região denominada de Pastos Bons, às margens do Rio Grajaú, e o desafio proposto é definir os limites entre a imposição cultural e a preservação das tradições indígenas. O Maranhão continua sendo objeto de observação e análise por Antônio Cordeiro Feitosa que perscruta a contribuição dos saberes indígenas no período colonial. Sem duvidas, os povos tradicionais representaram empecilhos para o povoamento e o estabelecimento dos colonizadores no Brasil, contudo, há situações em que contribuíram para os sucessos dessas iniciativas. Para o autor, as colaborações têm múltiplas causas e situam-se entre as vantagens prometidas e a dependência dos lusitanos para sobreviver no ambiente rigoroso e desconhecimento que acabavam de ocupar. Paulo Humberto Porto Borges comparece com a narrativa do imaginário sobre as migrações de Claudio Vogado e sua parentela, bem como, com o cântico ancestral do povo Guarani seguindo o rastro dos vogados e a longa caminhada rumo a terra sem males. Em sua pesquisa identificou inúmeros aldeamentos no Paraná que resultaram de deslocamentos ocorridos ao longo dos últimos anos. São dados que demonstram a perseguição às comunidades indígenas ao longo do século XX. Ilanna Maria Izaias do Nascimento e Maria Aparecida Silva de Sousa narram a festa do Divino Espírito Santo, em Alcântara, no Maranhão. Trata-se de uma manifestação do catolicismo popular que reúne um conjunto de celebrações e formas de expressão, religiosas e profanas, de saberes e fazeres, constituindo fortes sentidos de identidade local. Destaca-se a presença marcante das mulheres tocando tambores (as caixeiras) o rigor e a suntuosidade das personagens que remetem à corte imperial. A preservação da memória e o significado dos mecanismos que permitiram a sobrevivência da festividade são os principais problemas da pesquisa desvendados pelas autoras. Por fim, A linguagem religiosa, entremeada pela educação e a memória, é um dos marcos fundantes na formação da Escola Getúlio Vargas, em Guanambi, na Bahia. Na exposição de Tatiane Malheiros Alves e Lívia Diana Rocha Magalhães, acerca da educação, linguagem cívica e os quadros sociais de referencia da memória nacional durante os processos ditatoriais, a linguagem cívica e moralizadora do regime ditatorial varguista surge como elemento de manutenção da ordem e da sustentação do Estado como benfeitor e mantenedor. Diante de temáticas tão relevantes, atuais e oriundas de rigorosas pesquisas científicas ensejamos que se estabeleça um intenso debate a propósito da diversidade cultural, religiosa, linguística e um profundo respeito aos direitos humanos que têm sido retirados desde os tempos da América portuguesa e permanecem até os dias atuais. José Alves Dias Lívia Diana Rocha Magalhães (Organizadores)
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